Primeiro, começas por duvidar. Algumas coisas deixam de fazer sentido. Questionas. Não obténs resposta. Pensas que és tu que não compreendes. Relevas as incertezas e resignas-te, tal é a vontade de acreditar. É mais confortável. Resolve-te uma enormidade de problemas. Não queres ser cético. Não queres ser o único cético.
Depois acreditas. Todas as células do teu corpo acreditam. Roças o fanatismo e as dúvidas de outrora foram momentos de fraqueza. Imperdoáveis. A fé é tudo e tudo o mais é heresia. Tornas-te missionário e vais pelo mundo espalhando a boa nova, divulgando as virtudes do teu credo. Até te deixas crucificar.
Cais da cruz e as dúvidas regressam. Demoras mais tempo a encontrar respostas. Queres encontrá-las. Procuras… procuras… Não descansas até as descobrires. Torna-se uma obsessão. Tens medo de deixar de acreditar. Temes o julgamento dos outros. E se estás errado? E se és tu que não procuras nos sítios certos? E se és tu que não tens capacidade de o fazer? Forças-te a fazer parte. Tens que fazer parte.
Fazes de conta que acreditas. E de tanto fazer de conta, convences-te que, mais uma vez, estavas errado. Como é que não viste? Como é que caíste mais uma vez na armadilha dúvida? Como é que não percebeste? A história fazia sentido. Sempre fez sentido. Foca-te! Concentra-te! Não te distraias! Achas-te melhor que os outros?
Agora a cruz cai em cima de ti e duvidas mais uma vez. Recusas-te a aceitar que estiveste errado este tempo todo. Não estiveste. Enquanto acreditaste fez sentido. Fazia sentido e preenchia-te. Não baixaste os braços e trabalhaste com todas as tuas forças. Deste o teu melhor. Valeu a pena. Afinal de contas, aquela era a solução, naquele momento, para todos os males.
Continuas a duvidar. Ainda queres acreditar. Tens pena. Mas já não consegues.
Artigo publicado na edição de hoje do Diário Insular.